segunda-feira, julho 06, 2009

a gente manda-te pelo correio

Julieta demorou três semanas, vinte e um dias certos, a fazer as malas. Acondicionou cuidadosamente um litro de champô, trinta cuecas, panos da loiça e do pó, sacos de plástico por estrear, daqueles transparentes. Levou umas galochas e outros sapatos. Uma toalha turca, um quilo de açúcar, um pacote de marmelada e dez latas de atum. Julieta tinha medo de passar fome. Levou também um pack económico de bolachas Maria. Na carteira levou um saquinho com Flocos de Neve e Doutor Bayer. E uns rebuçados de eucalipto e mel, já bastante antigos.
Recebeu de cada vizinha ou uma medalha de alumínio ou, uma novena de plástico ou, um postal ilustrado com uma oração impressa. A senhora da mercearia deu-lhe mais um pacote de bolachas, das de aveia e chocolate, as mais caras que tinha, e um conjunto de três sumos cujo pacote tinha desenhos de animais.
No momento de sair de casa e fechar a porta à chave, teve a certeza de que tudo o que precisava tinha ficado lá dentro. Mas a mala ia tão pesada, não caberia mais nada por mais pequeno que fosse. Disse à vizinha da frente estar com a sensação de que se esquecera de algo, e ela respondeu-lhe que se lhe faltasse alguma coisa haviam de a mandar pelo correio. Julieta acenou com a cabeça como tranquilizada e saiu do prédio.
Cá fora distribuiu beijos e abraços e recebeu conselhos, percebeu que toda a gente estava convencida que se ia realmente embora. Desceu a rua com a sua mala pelo chão, virou-se para trás e acenou e todos acenaram de volta, como se já soubessem que ela fosse acenar.
De ter descido o resto da rua, não se lembra. Sentiu as suas pernas serem levadas por uma força motriz que não conhecia. Quando deu por si, estava dentro do táxi, a lembrar-se das palavras da vizinha. O que precisares a gente manda-te pelo correio.

no país das maravilhas

A nova Alice, pelo Tim Burton








sexta-feira, junho 19, 2009

segunda-feira, junho 08, 2009

efeito luminoso


Madalena desceu as escadas como sempre fazia. As mesmas escadas de sempre. E desceu-as com o cuidado habitual porque estava sempre escuro ali. Enquanto avançava, pensamentos armazenados durante a noite cruzavam-se na sua cabeça, definindo um estranho anagrama de várias cores e palavras diferentes. Por isso o caminho até ao último lance de escadas lhe parecia tão distante.
Madalena tentava aninhar as ideias em categorias de importância e outras, para antes de abrir a porta da rua, deixar tudo o mais arrumado possível. Mas não estava a ser assim tão fácil. Então ficou um pouco mais no escuro até começar a conseguir ver os contornos das coisas à sua volta. Passado um tempo, pouco tempo, reparou numa fresta ténue de sol que rodeava a porta. Não esperava ver aquele efeito luminoso mesmo ali à sua frente, e de repente teve uma enorme vontade de rir. E riu-se sozinha.

segunda-feira, junho 01, 2009

sexta-feira, maio 29, 2009

celebremos

Palma de Ouro para João Salaviza com ARENA

domingo, maio 17, 2009

a visita

(Feira da Luz, 2006)

A visita correu bem. Sem enjoos e solarenga.

Combinaram um café para Maio do ano que vem.

terça-feira, maio 12, 2009

à beira guichê

A Senhora das finanças informou-me que tenho um filho.
Disse-lhe que não, que não tenho filhos.
Mas ela insiste que sim, que está no Sistema.
Também me disse que fiz o IRS em 2001, na Amadora.
Disse-lhe que não, que era impossível.
Mas está no Sistema, e olhou para mim com um ar muito compenetrado.
E perante tal Sistema omnisciente, limito-me a citar o meu caro O´Neill. (Enquanto não resolvo um problema à beira guichê eventualmente grave).
que à beira-guichê é assim a vida.