domingo, dezembro 03, 2006

no país das maravilhas

(Diana Thater, 1997. Projecção de imagens, video)


No País das maravilhas todos andam felizes. Há água suficiente e luz suficiente. Os cães estão sempre na rua, em sítios próprios para cães. Só se aproximam das pessoas quando precisam mesmo de uma festa. Focinho ou barriga. Naquele país, não existe uma única árvore morta, ou doente.

Alice viveu nesse país e tinha uma casa e um jardim, como todas as outras da sua rua. Usava vestidos especialmente costurados para si, com as suas cores preferidas. Gostava mais dos tons de azul ou verde.

Alice tinha sempre um avental, por cima dos seus vestidos. Gostava de pintar. Às vezes a vontade era tanta, que pegava nos pincéis, nas tintas, na água e nos óleos, e nem se lembrava do que trazia vestido.

Por isso mesmo, a mãe dissera-lhe: - "Alice, ou os vestidos ou a pintura. Não vês, como estão a ficar estragados?".
A menina ficou preocupada e até dormiu mal nessa noite. Sonhou com coisas estranhas, coelhos atrasados para a vida e um gato de sorriso trocista. Sonhou que se perdia num labirinto e não conseguia encontrar o caminho de saída. Na manhã seguinte acordou cansada, e com a sensação de ter estado a jogar um complicado jogo de cartas. Daqueles que fazem pensar. Doía-lhe a cabeça e sentia o seu cabelo tristonho.

O dia começou e parecia igual a todos os outros. Pequeno almoço – almoço – sesta. Alice foi deitar-se debaixo da árvore que mais gostava, a que tinha mais sombra. Fechou os olhos e sentiu o ar a entrar pelo seu nariz. Agora estava outra vez no caminho onde tinha encontrado o gato sorridente. Sentia-se diferente, já não estava assustada, e parecia mesmo que o seu passo seguia seguro. Caminhou bastante e conheceu muitos animais e pessoas diferentes.

Quando estava tentar entrar por uma porta muito pequena, ouviu uma voz : "Alice, Alice! Vamos, é hora de lanchar". Conhecia aquela voz, era a sua mãe a chamá-la. Não podia ir lanchar, não agora. Então, fez muita força para fechar os olhos. Depois, a voz tornou-se cada vez mais longínqua e desapareceu.
Finalmente, Alice conseguira entrar na minúscula porta, até porque ela própria ficara muito mais pequena. Ao espreitar o que estava no outro lado, Alice caiu, ou voou, ou planou como se fosse uma pena. Foi cair mesmo em cima de um tubo de tinta gigante. Azul Ultramarino, a sua cor favorita. Olhou ao seu redor e tudo era cor e movimento. Pedaços de tinta nasciam do chão e depois voltavam a desaparecer. Encostados ao longo das paredes, estavam pincéis de todos os tamanhos e feitios. Grandes árvores de papel, espalhavam-se pelo espaço, balouçando folhas de diferentes tamanhos e texturas.
Os olhos de Alice brilhavam muito, como se a verdadeira luz nascesse dentro deles. Fez muita força para não os abrir. Nunca tinha sido tão feliz.

4 comentários:

El-Gee disse...

é para mim agora claro que tens de ler "As Cidades Invisiveis"

joana pais de brito disse...

combinado...

El-Gee disse...

http://www.amazon.com/Invisible-Cities-Harvest-Hbj-Book/dp/0156453800/sr=8-1/qid=1165502820/ref=sr_1_1/103-5369054-0211031?ie=UTF8&s=books

p.s., para aguçar o apetite:

http://on-how-i-fought-in-the-easter-rising.blogspot.com/2006/07/as-cidades-e-o-desejo.html

joana pais de brito disse...

boa! obrigada..