sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Ela

(Uemura Shoen, 1918, Flame)


Ela não precisava de dizer uma palavra. Nem se sabe explicar. Era um baixar da cabeça imperceptível para todos (até os pássaros mais atentos seguiam o seu caminho, sem reparar).
Tudo se realizava na parcimónia das horas compridas, sem pressas ou denúncias.


Caminhava ausente, a pensar em tudo. Tentava separar os pensamentos das emoções, dos imprevistos, das dores. Às vezes conseguia.
Como um recorte infantil, pairavam à frente do seu nariz , e só por ela visíveis, dezenas de papelinhos com códigos, cores, palavras soltas, versos, imagens, partes de fotografias,de canções.


Depois, a tarefa era ordená-los por importância ou interesse. Aqueles que ela não compreendia, guardava para mais tarde, na esperança de conseguir perceber o seu significado.


Os que conseguia ordenar eram fixados pelos seus olhos, e imediatamente levados para um lugar seguro e quente, dentro de si.


Alguns eram esquecidos, por não serem suficientemente verdadeiros.


Enquanto isto, continuava a sua viagem sem que nada a incomodasse.

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