quarta-feira, julho 09, 2008

love boat


Seria a primeira vez de Iara. Os serviços da agência fora-lhe apresentada por Zenilde, uma amiga brasileira, já muito batida naquelas andanças.

- Vais ver que vais gostar, é tudo pessoal simpático, educado. Há médicos e tudo. Até advogados, vê lá.

Mas Iara não se convencia, achava aquilo tudo muito estranho, contra as leis do desejo e da atracção. E do Amor. No fundo era isso. não conseguia ver as coisas de outra forma que não aquela que aparece na televisão. Em verdade, não conseguia ver as coisas de outra forma porque já tinha conhecido o Amor. Esse Ser, ou Coisa, ou Nome. Ou coisa sem nome. É certo que tinha já passado muito tempo, quase 15 anos. Mas Iara queria com todas as suas forças e pedia a todos os santinhos, sempre com o cuidado de não exagerar, que Essa Coisa Sem Nome, se cruzasse outra vez no seu caminho. Claro que isso lhe complicava a vida, ou pelo menos, tornava-a menos simples.

Iara sonhava em tropeçar na rua e deixar cair a mala para alguém a apanhar, e depois cruzar o olhar com esse alguém. Sonhava em receber flores brancas, margaridas ou assim, de um rapaz que finalmente arriscara declarar o seu Amor de há muito. Sonhava em casar, claro. Numa quinta, claro. Com karaoke e cascatas de champanhe. Sonhava em ter um anel de 1 ano de namoro, um de noivado, e uma aliança. Tudo em mãos diferentes e altamente específicas. Iara tinha decidido que o seu bolo de noiva teria folhas hera douradas (com ouro verdadeiro) à volta. E por dentro seria simples, porque gostava de coisas simples.
Para o mês que vem fazia trinta anos, e a amiga andava preocupada com ela. Queria que a sua vida desse uma reviravolta e que ela conhecesse alguém, finalmente. Ou sem ser finalmente, só para conversar, nada de mais. Mas isso era de mais para Iara. Uma coisa puxa a outra e o que iriam pensar dela? Com certeza que era uma oferecida, uma pessoa que não se sabe dar ao respeito. E falar assim com um homem? E se ele for compremetido? Casado? Derradeira das aflições.

Zenilde decide então agir sem consentimento, e inscreve Iara numa festa de speed dating que teria lugar num veleiro, à noite. Ela também se inscreve. No dia marcado, diz a amiga que precisa de ir ao gatil, onde são voluntárias, mudar a água dos da ala com mais de 10 anos. Iara claro que anui ao pedido da amiga. A meio do caminho apercebe – se que aquele não é o caminho normal, mas não diz nada. A amiga pára finalmente o carro e estão em frente ao cais, à beira rio.

- O que é que se passa?
- Nada, é a minha prenda de anos adiantada.
- Um passeio de barco?
- Sim, um passeio de barco.
- Mas…
- Vais ver que vais gostar, é tudo pessoal simpático, educado. Há médicos e tudo. Até advogados, vê lá.

Iara ainda tentou dizer qualquer coisa como “médicos e advogados?”, mas a amiga arrastou – a até à entrada do veleiro e colocou-se atrás de uma fila de pessoas. Iara estava hipnotizada sem perceber o que estava a acontecer. Chegou a vez delas e a amiga disse o nome de ambas, a um homem vestido de marinheiro. “Bem vindas a bordo”, disse ele.

E depois tudo se apagou. Perdeu as forças nas pernas e só se lembra de alguém lhe agarrar a mão.

4 comentários:

Anónimo disse...

E eu a achar que a Zenilde é que se ia declarar...

joana pais de brito disse...

à Iara?

Anónimo disse...

Sim, à Iara. Era uma reviravolta.

míscaro disse...

Pois era...mas era demais para a pobre...