segunda-feira, outubro 06, 2008

e nada mais



O sal começa a fazer o seu efeito de purga e adormecimento. Através da água turva é possível ver-se dois vergões avermelhados em cada pé.

Mais uma festa sem canapés, mais um ovo estrelado para o jantar. Basta um ovo para acalmar um estômago vazio. Um ovo, e um copo de qualquer coisa. O que houver.
As expectativas de camarões enfolhados, espetadas de fruta e anchovas em ararutas, tinham saído completamente logradas. Flutes de champanhe e nada mais. E talvez fosse espumante, era demasiado doce.

A toilette era proporcional aos papeis que lhe eram atribuídos, sempre a mesma de sempre. De qualquer forma, ninguém ia reparar. Esse tempo já era. Era um passado tão distante que parecia nunca ter existido.
Tivera o cabelo preto pela cintura, em trança, ou bem apanhado lá no alto. Agora era preto, às vezes. Outras, para o acobreado. Conforme o estado de espírito e a marca da tinta.

Estava tudo tão bonito na festa. Todos luminosos, na esperança de serem captados pelos obturadores ainda pouco vorazes de uma indústria recém-nascida.
Sabia-lhe bem ser cumprimentada, ser reconhecida, e naqueles momentos sentia que fazia sentido, tudo em geral. Sentia-se detentora de um qualquer lugar no lamé instável.

Depois da noite de luzes, a casa esperava-a, a mesma de sempre, de há anos, com os remendos de há anos. E só desejava tirar os sapatos e pendurar o figurino no cabide de madeira. Era uma espécie de alívio, uma espécie de tristeza. Acima de tudo queria comer um ovo e beber qualquer coisa.

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